Imagine um grupo de artesãos construindo um navio dentro de uma garrafa: assim foi o meticuloso trabalho da Comissão de Juristas para Revisão Legal da Exploração de Portos e Instalações Portuárias (Ceportos). Instituída pelo presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, a comissão finalmente revelou seu relatório final.
O anteprojeto visa modernizar e aprimorar a Lei 12.815/13, mas será que essa nova embarcação normativa está pronta para navegar pelos canais dos Terminais de Uso Privado (TUPs) ou trará mais gargalos à entrada de investimentos privados no país?
Antes dessa análise, é crucial reconhecer o papel vital do setor portuário no comércio exterior brasileiro. No primeiro semestre deste ano, as exportações marítimas cresceram 3%, e as importações, 2,9%, com uma corrente de comércio de US$ 243,5 bilhões. O setor movimentou impressionantes 645 milhões de toneladas, sendo os TUPs responsáveis por 64,1% do total. Os números evidenciam que os portos são as artérias do comércio do país e, os TUPs, os músculos que impulsionam essa corrente vital.
Apesar desses valores expressivos, a redução no número de autorizações acende um sinal de alerta sobre os processos regulatórios que outorgam e regulamentam esses empreendimentos enquanto autorizados. Assim, a Associação de Terminais Portuários Privados (ATP), sozinha ou com a Coalizão Empresarial Portuária, apresentou uma série de propostas, cobrindo desde temas jurídicos e regulatórios até questões de licenciamento ambiental e patrimonial.
Ao analisar o anteprojeto, constatamos que muitos pleitos foram contemplados, o que poderá significar a desburocratização regulatória e o aumento da segurança jurídica. Tais aperfeiçoamentos, em sua maioria, atendem aos anseios do segmento, como a inclusão de diretrizes que estabelecem que a intervenção do Estado na atividade econômica seja subsidiária e excepcional, refletindo a Lei de Liberdade Econômica (13.874/19).
Porém, temas de interesse específico dos TUPs não foram contemplados ou têm pontos preocupantes. A exigência de chamamento público para outorga de autorizações é como instalar semáforos em alto-mar; isso introduz complexidade desnecessária no modelo que prioriza a iniciativa privada, comprometendo a eficiência e a atração de investimentos. E, a ausência de previsibilidade nos processos de licenciamento é desafio não resolvido pelo anteprojeto, comprometendo a expansão e modernização dos TUPs, além de elevar custos operacionais.
Vale mencionar que o anteprojeto, ao se limitar à revisão da Lei dos Portos, não abordou inconsistências da Lei 10.233/01. Isso inclui a precariedade das autorizações, que não asseguram direito adquirido às condições vigentes da outorga, e a ausência de delimitação dos princípios aplicáveis ao transporte terrestre e à infraestrutura portuária.
O anteprojeto é, sem dúvida, um passo importante rumo à modernização do setor portuário. Porém, é crucial corrigir rotas para garantir que os TUPs continuem sendo protagonistas estratégicos no comércio exterior. A ATP permanecerá contribuindo ativamente para aperfeiçoar esse debate, propondo ajustes que promovam a competitividade e a segurança jurídica.
Murillo Barbosa é Diretor Presidente da ATP – Associação de Terminais Portuários Privados. Artigo em colaboração com Rafaela Brandão, analista jurídica.
Artigo publicado dia 07/12/24, no jornal A Tribuna.