Ao apagar das luzes de 2021, o Tribunal de Contas da União decidiu, por unanimidade, autorizar o Ministério de Infraestrutura a dar continuidade ao processo de desestatização da Codesa-ES, que compreende os portos organizados de Vitória e Barra do Riacho. Ao indeferir os pedidos de adiamento da Associação dos Terminais Portuários Privados e da SUPORT-ES, o Ministro Relator alegou que por se tratar de um empreendimento de interesse estratégico com prioridade nacional e considerando que as falhas e inconsistências identificadas pela área técnica já estavam, majoritariamente, em processo de saneamento pelo Poder Competente, o procedimento deveria continuar observadas as (muitas) recomendações listadas pela Secretaria de Infraestrutura de Portos e Ferrovias.
Não foi considerada também a opinião do Ministério Público de Contas que exigia pronunciamento acerca da ilegalidade e ilegitimidade dos atos fiscalizados tendo em vista que houve falta de fundamentação na escolha do modelo, nas consultas públicas promovidas não foram divulgadas informações técnicas, econômico-financeiras, ambientais e jurídicas constantes do estudo de viabilidade e a documentação originalmente encaminhada para o TCU continha informações inconsistentes e imprecisas.
A decisão não foi a esperada pela ATP e por grande parte dos afetados pela desestatização, pouco ouvidos durante o processo. Por se tratar de um empreendimento estratégico, pelo ineditismo e por ser um “leading case”, cujas decisões transbordarão para as mais de três dezenas de portos, é que sempre defendemos mais discussões sobre o tema. A decisão final valerá pelos próximos 35 a 40 anos. É muito tempo e empresas poderão desaparecer.
Os posicionamentos manifestados nos autos apontam que todos os posicionamentos da ATP são coerentes com os objetivos da desestatização - a melhoria da gestão das administrações portuárias, a eliminação de repasses financeiros da União, a atração de novos investimentos e, eventualmente, geração de receita.
A escolha do modelo é fundamental com a análise caso a caso em razão da diversidade de portos públicos existentes no país. O próprio Programa Nacional de Desestatização contempla diversas modalidades operacionais a serem consideradas em cada situação.
O possível aumento dos custos portuários é preocupante, pois afetará a competitividade dos produtos. Vencedor da licitação pelo maior valor de outorga, conceito de receita teto em algumas tarifas, liberdade de cobrança em outras, aliado ao monopólio natural que será prerrogativa do concessionário são outros pontos de preocupação. Mais preocupante ainda foi o fato de a área técnica ter identificado com rapidez distorções significativas em valores apresentados na documentação que provocaram redução de 29% no valor de direito de outorga, 37% no valor da receita teto para a infraestrutura de acesso aquaviário e de 49% na receita teto da infraestrutura de acesso terrestre. Tais inconsistências e imprecisões apontadas pelo MP deveriam ser suficientes para provocar o reestudo do processo.
A falta de transparência e de diálogo com a sociedade são alarmantes. Foi negado o pedido de todos os interessados para a divulgação dos estudos que deram sustentação as decisões, com o argumento do sigilo do processo. Quando, por ação do TCU, quase a totalidade do processo foi liberada ele já estava em sua tramitação final. Agora, só nos resta aguardar e torcer para que tudo dê certo, que seja um jogo de ganha-ganha, porque se tivemos perdedores quem perderá é a competitividade do produto brasileiro.
Murillo Barbosa – Diretor-Presidente da ATP (Associação dos Terminais Portuários Privados)
Artigo publicado dia 08/01/22 na coluna Popa e Proa, do jornal A Tribuna.